domingo, 10 de maio de 2009

As Aventuras do Príncipe Tupiniquim


Tinha tudo planejado. Queria fazer uma surpresa para a moça, depois de um dia difícil. Desejava trazer um pouco de calor aos braços e lábios dela. Para tanto, bastava percorrer os kilômetros que os separavam, com seu destemido cavalo oval de nome KA modelo 2002/3 cor prata; tudo daria certo. Ao chegar, desceria da sela, e com todo o esplendor de um príncipe contemporâneo, tomaria os lábios da princesa para si. Este era o plano! Perfeito! Sem nenhuma falha, sem nenhuma vicissitude impossível ou improvável. Afinal era segunda-feira, 22:00, ainda cedo. BigBrother no ar. A princesa não estaria dormindo. Além do mais, isso aqui não é a história da bela adormecida!
Foi. Sem hesitar. Sem titubear. Sem ligar para o telefone da donzela. À maneira dos bardos e vikings de outrora: chegando sem ser convidado. Ele desce do cavalo, com uma dignidade ímpar e uma pose de nobreza – um verdadeiro Príncipe Charles Tupiniquim – e vê o castelo. Um alto e antigo palácio onde muitas histórias foram construídas e destruídas. As paredes cantavam nomes de um tempo passado, onde sonhos vagavam pelos corredores largos. O bravo príncipe contemporâneo chega ao portão de aço maciço e enferrujado; um vento cortante gela sua espinha e um enorme fosso com cavalos antigos se faz à vista. Ele então toma coragem e lança suas palavras para dentro do coração do velho palácio.
Alexandre, O Grande Sem Noção - Alas! Alas! Vim, vi, e venci! Desejo entregar meus beijos e abraços para a Carolina do sexto andar!
... (silêncio)
Alexandre, O Grande Sem Noção - Desejo encontrar com a princesa! Trazer afeto em tempos de fúria! Trazer carinho em tempos de Cólera, Pancreatite, Cânceres, Infartos, enfim, em tempos de plantão na São Vicente!
... (silêncio)
Alexandre, O Grande Sem Noção - Alôoooooooooooo!
(alôooooo!)
(alôoo!)
Nando, O Dragão Cavernoso - Alô! Alô! Jackson? Jackson? Não? Com quem você quer falar?
Alexandre, O Grande Sem Noção - Com a Princesa Carol, por favor! Venho de terras distantes, trago presença de presente!
Nando, O Dragão Cavernoso - Eu sou o gateman. Ninguém vem ao pai – ou à filha – senão por mim!
O vil dragão era místico e com poderes mágicos, sua voz cavernosa vinha pelo interfone.
Alexandre, O Grande Sem Noção – Ah, beleza! A Carolina do 601 está?
Nando, O Dragão Cavernoso - Peraí, tô no banheiro. Deixa eu sair daqui e já converso contigo! (interfone: chuáaaaaaaaaaaaaaaaa)
Pronto! Tudo bem? Quer falar com a Carolina, né?
Alexandre, O Grande Sem Noção - Sim, mas eu poderia entrar? Está chovendo aqui fora! Posso esperar no saguão?
Nando, O Dragão Cavernoso - Não, forasteiro! Ordens são ordens, e eu só as cumpro. Aguarde e prove seus sentimentos! Demonstrações e provas, é disso que o coração precisa para atestar sua chama! Aguarde por favor...
Enquanto esperava pacientemente, as fantasias corriam sua mente. Como seria bom vê-la! O príncipe adorava ficar junto da princesa, na rua, na chuva, na fazenda, ou mesmo em Piraí! Tinha ótima conversa e seus trejeitos eram adoráveis. Gostava de Chico Buarque, Tom Jobim, Ary Barroso, tudo que ele gostava também... ela desafiava o príncipe em duelos culturais, e amiúde o vencia. Aiai, era muito legal estar ao lado dela; mesmo sabendo que seu tempo nas terras do Sul era escasso. Ele teimosamente insistia neste R (que não é R) de onde era possível avistar à frente o abismo da separação. “Mas afinal, todos nós estamos fadados ao abismo, não é mesmo? Então, que eu pule, minhas asas abram e eu possa voar!”, pensava ele. Porém os minutos passavam, passavam, e nada. Algo estava errado. Será que outro príncipe havia chegado antes e ganhado sua mão? Ah! Não! Nãoo!! Vão embora, fantasmas da noite! Deixem-me! Deixem-me!
O Dragão Cavernoso, então, veio trazer-lhe a realidade. O rei dissera que desconhecia o príncipe. Ele que viera noutro dia visitá-lo! Chegou a conhecer a Rainha, seus troféus de caça, sua árvore Genealógica Real... foi um golpe duro e deveras fundo. Sentiu-se Persona Non Grata, de imediato. Quase foi embora, mas quando estava prestes a fazê-lo, o gateman abre os portões pesados e pontiagudos permitindo sua entrada.
Nando, O Dragão Cavernoso - Suba, a princesa o aguarda.
...
O príncipe tupiniquim então toma carona na torre pantográfica, que só voa para cima ou para baixo, e chega enfim à morada da bela. Ela o espera na porta. Uma luz fraca de tocha elétrica ilumina o corredor, onde plantas carnívoras fazem a vigília. Todo o cuidado era pouco naquele momento, poderia muito bem ser engolido por uma daquelas enormes plantas. Ela o aguardava silente; estava adormecida, sim – mesmo não sendo esta a história da bela adormecida – e muito enfezada. Ah! O Rei e a Rainha estavam enfurecidos com a audácia do pretendente de chegar assim, sem avisar e sem ser convidado. Quase que convocam os exércitos reais, também chamados de Puliças, para debelar tal invasão.
Alexandre O Grande Sem Noção fica então sem saber onde enfiar a cara; pede todos os perdões do mundo. Diz que perdeu a honra, que vai cometer um Haraquiri tropical, ouvindo tropicália até a morte. Tudo o que ele queria era trazer afeto, abraços e beijos para ela – como tudo pode dar errado, tão depressa? Não!!! Será que o Rei vai me afastar dela? Será que a Rainha vai me odiar? O que será, o que será? Mais importante, porquê eu estou preocupado com isso, se é uma R que não é R? AHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH!
...
Epílogo:
O príncipe não pode entregar seus beijos e afagos como gostaria. Sentiu que não era dele aquele momento, que estava de intrujão. Sentia que havia errado, que havia passado por cima de leis e regras de bom senso. Mas ele, quando apaixonado, não consegue ser um homem apropriado! ele pula nas piscinas de bolinha do Habibs! Enfim...
A tragédia tomou seu coração e mente; ele partiu desolado e desterrado do castelo da Província de Copanema e regressou, só e triste, para a Província do Leme. Neste lugar, era amigo do Rei; lá poderia ter a mulher que quisesse, na cama que escolher. Mas ele queria a Princesa Adormecida, ela e nada mais! Ah, vá para longe! Vá embora pra Pasárgada! – digo, Piraí infante! Alas! Alas! Tudo tudo tudo vai dar pé!
...
FIM

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