domingo, 10 de maio de 2009

Ishmael e a Caça a Reyna (ou Moby Dick do Século XXI)

Parte V

No meu relógio de bolso, os ponteiros acusavam 9:30am, quando o imediato gritou: “Leviatã! Leviatã! À sotavento! Sotavento! Puta-dos-mares! É gigante! Gigante! AHOOOOOOOO, acorram!, acorram a seus postos!”. Era o chamado para a guerra. Minha bússola mágica acompanhava as movimentações da besta, que fazia-se ver a milhas de distância. Como medir e descrever um sonho em poucas palavras, ou mesmo em muitas? Talvez impossível de traçar retrato fiel; acredite apenas nas palavras deste marujo, tratava-se de um cetáceo 5 vezes maior que a nossa embarcação. E nosso barco, diga-se de passagem, era do tamanho desta Taverna! Tive receio pela minha vida, pois eu era o arpoador do navio. Minha função era espetar baleias com enferrujados arpões, como se fossem churrasquinhos de gato. Hesitei e pensei em ter uma salmonellose, o famoso “pede pra cagar e sai”, mas não; não podia, não devia voltar atrás. Nunca há retorno, e uma oportunidade quando desperdiçada, ah! Nunca mais retorna. Não se pode entrar duas vezes no mesmo rio. Não adentra-se duas vezes no mesmo mar.
“Arpoador, a seu posto!” comandaram-me. Pedi para que emparelhassem o quanto possível com a besta, que já estava a 40 milhas de distância. 295 graus, Lafayette! No SOHO! South Of Houston! desci no microbote motorizado que ficava a estibordo. Parecia ridículo tentar engajar uma baleia daquele tamanho em tal penúria, mas são os ossos do ofício! Em comparação com um homem, o tamanho era este: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Blue_whale_size.svg
Mas nossa escola era das antigas, nada de arpões com mira eletrônica, nada de computadores. Esta era a luta descomunal do homem com a maior besta da Criação, Reyna! Sem dúvida era ela! Esta baleia azul reinava absoluta nos mares. Foi quando notei outros navios baleeiros, também da velha escola, descendo seus arpoadores em seus microbotes motorizados. Seus nomes grafados no casco: Alison, Yuwhen, Tiffany, Leah, Thereza, Paolla, Leo, tantos! Eu era o único bote brazuca; haviam poucos estrangeiros, e muitos botes americanos advindos das 11 escolas da NYU: Stern Business School, Gallatin, Tisch, Wagner, etc. Eram ao todo 58 botes. Uma competição ferrenha se desenharia! Quem levaria o prêmio para casa? Percebendo a força de Reyna e suas investidas contra as embarcações maiores, gritei em desespero para que todos pudessem trabalhar em equipe. Reyna neste exato instante investiu contra o Yuwhen e destruiu a proa do navio, causando este a ir a pique. Pânico. Gritos. Túmulo azul.
Um grupo de 15 baleeiros se reuniu próximo ao meu barco, e traçamos uma estratégia conjunta. Parecia uma reunião em uma sala espaçosa, quase uma dinâmica de grupo. Enquanto a água espirrava em meu cabelo, disse que precisávamos resolver esta situação como se ela fosse um intrincado problema social, com os vários personagens (stakeholders) em jogo. Ah, aye! Teríamos que atacar de todas as frentes! Para se ter uma idéia do plano, vamos a uma analogia:
O estado de NY está com uma nova política de fechamento de prisões para delinquentes juvenis, transferindo os mesmos para pequenas casas vigiadas. O complexo prisional a ser fechado no estado é o maior do país, com capacidade para 512 indivíduos. Porém, só 12% da capacidade está sendo utilizada e metade do prédio está em mau-estado de conservação. Não podemos simplesmente demolir o complexo pois US$ 40 milhões de dólares de dinheiro público foram gastos em sua construção e as famílias em seu redor dependem economicamente do estabelecimento; existe um sindicato de agentes prisionais muito forte, que certamente estaria descontente se perdesse o emprego. O prefeito tem ligações políticas com este sindicato e ir de frente com ele não é a mais sábia das decisões. A economia do estado está em perigo; uma transição gradual deve ser feita, porém é imprescindível cumprir esta nova política estatal. A parte que não está decrépita possui piscina, ginásio poliesportivo, estúdio de música, carpintaria. Como atacar este problema garantindo que todos saiam com parte de seus interesses respeitados?
Então, com esta visão em mente, nosso grupo flanqueou Reyna e conseguiu desferir-lhe uma, duas, três belas arpoadas; as armas ficaram enterradas na lateral do monstro, que logo revidou com uma barbatanada: jogou cinco competidores ao mar, sem piedade. Solicitei que reagrupássemos; a dor do ataque tinha deixado a baleia furiosa! Afundou gerando um redemoinho enorme, que engoliu dois microbotes e mais dois arpoadores. “Vamos! Coragem, porra!” gritei para mim mesmo. Pouco a frente ela ressurgia para respirar. Bem em cima de um bote, o Leah: “AHHHHHHHHH!!”
Estava cansada e ferida, e isso era vantagem para nós. Estávamos em uma distância de fala, então gritei: “é como Xadrez! Temos que prever todas as jogadas antes, e só então partir para o ataque! Plan before action, guys!” E de fato era um xadrez humano-baleífero. Mais uma vez recorro a uma alegoria, para que vocês entendam:
Vários papéis A4 no chão, em forma de cruz, contendo cada um letras: S1 S2 S3 S4; W1 W2 W3 W4; L1 L2 L3; K1 K2 K3. Cada baleeiro ficava sobre um número, olhando reto para o outro lado. Havia um papel com a letra O no centro, na intersecção dos dois eixos. Tinhamos uma porralhada de regras ditadas – e não repetidas – no começo, e devíamos chegar em uma formação final determinada. Só podíamos mover um a cada vez, e tínhamos 30 minutos para resolver em conjunto o problema. Poderíamos voltar e começar de novo quantas vezes fosse preciso. Havia um do grupo que era o Observador Externo, e ele só podia falar três vezes ao total.
Com este novo plano e formação, meu bravo grupo de caçadores resolveu, com tática, esta situação HarryPotter-like. Mais uma arpoada, dessa vez próxima ao poro respiratório do Leviatã! Sangue vazou para dentro, e ela pareceu broncoaspirar. Afundou fazendo um som que podíamos ouvir, mesmo fora d’água; um som horripilante!
http://en.wikipedia.org/wiki/File:Blue_Whale_NE_Pacific.ogg
E desapareceu manchando de sangue as águas do Atlântico Norte. Não sabíamos o que pensar, muito menos como agir. Só podíamos esperar seu retorno para o embate final.

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