domingo, 10 de maio de 2009

Ishmael e a Caça a Reyna (ou Moby Dick do Século XXI)

Parte III

O sol ofuscava minhas retinas, pois a manhã era alta. Não tardei no processo de acordar: ergui meu corpo, fiz minha toalete matinal, vesti a cueca furada do avesso – afinal, sempre fui uma criatura avessa às regras –, o restante das roupas, meu saco náutico nos ombros, e desci para acertar com a casa. Minha angústia aumentava a cada segundo que permanecia em terra firme. Tinha que ir embora logo. Queria ver a linha do horizonte que só o mar delimita bem. Paguei o que devia, agradeci a gentileza da hospitalidade, e retirei-me da “Hospedagem Da Mammis”. Andei em direção ao cais da cidade, sem delongar, e em pouco tempo consegui trabalho em uma embarcação baleeira que estava prestes a zarpar. Contei do meu propósito, os marinheiros riram um pouco da minha audácia. Caçariam baleias, e não lendas. “Mas se você der sorte e encontrar com Reyna, o leme e a condução da caçada será toda sua!”. Concordei feliz, por ter uma embarcação apropriada para meu propósito.
Chamava-se Victory, em homenagem ao famoso navio-de-guerra inglês que batalhou arduamente na batalha de Trafalgar, onde o almirante Nelson foi atingido e morto em ação. Esta é uma foto da vista de popa do navio; tirei pouco antes de sair para alto-mar. Embarquei, fui atrás de meus aposentos no porão, arrumei minha tralha. Tudo estava pronto, nada mais me prendia. Fiquei rapidamente amigo do restante da tripulação, e quando dei por mim já estávamos longe do cais, no infinito azul-esverdeado.
Os dias se passaram, e só pensava em me preparar. Porém ninguém – muito menos eu mesmo – sabia como preparar-se para algo que não se tem a menor idéia. Reyna era de fato uma lenda, e os poucos que já entraram em combate com ela, ou não sobreviveram, ou eram tidos como contadores de história pelo resto do mundo. Nada era confiável. Todos os depoimentos, desencontrados.
Preparei-me então como pude, afiando meus arpões e cultivando a idéia-estratégia em meu espírito. O projeto “Luz, Câmera... Ação em Saúde!” estava bem sólido, sustentável, escalável e inovador, exatamente como Reyna gostava. Seria a isca perfeita, e quando ela estivesse próxima, bem próxima, minhas adagas do mar transpassariam seu coração ignóbil. Muitos amigos e conselheiros, vendo minha paixão pela Baleia-Mistério, ajudaram-me no preparo: sejam no navio, seja através de pombos-correio virtuais, chamados EMAILS. Traziam de longe dicas de luta e muito encorajamento. Até pombos-correio da minha saudosa Terra Brasilis chegaram! Alvíssaras e alento sua mensagem principal.
No entanto, a tensão do preparo foi avolumando-se, e quando percebi degladiava com um inimigo provavelmente mais cruel e sanguinário que Reyna: eu mesmo. Fantasmas trafegavam livremente em minha mente, suas vozes guturais gritando: “Esquizofrênico! Maluco!”, “Nunca vai ser um bom médico!”, “Ridículo, desprezível!”, “Fracassado! Eu sou melhor que você, você é um merda! Você não é nada!”, “Nós, os bundinhas, é que temos a verdade do que é ser bem sucedido! Nosso modelo é o correto! Seu inapropriado!”, "O que você faz aqui? Você não é bem vindo nesta Casa".
Ah! Eram as vozes dos pescadores de sardinha, aqueles tolos cujas almas cheiravam a estrume... sabe? por muito tempo comprei suas falácias, suas vilezas; acreditei naquilo que eles diziam sobre mim – esse talvez o maior erro da minha vida. E por isso sofri e perdi muito. Atordoado e em desespero, comecei a perder o fogo nos olhos e – mais uma vez – acreditei naqueles seres torpes cujos nomes me detenho de mencionar, pois blasfêmias são contra a boa fé e... se o fizer, minha boca corre o risco de cheirar a cocô. E ninguém merece ter bafo de cocô; por isso mais não digo. O resto é o resto.
E foi quando aconteceu...

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